sexta-feira, 2 de abril de 2010

A Cuca vai pegar: Crônicas do funcionalismo público II ou da Burra Cracia

Levei dois anos e meio para entregar a dissertação e dar entrada no diploma. Eu sei, isso é lamentável, assumo a ação terrível que é esse atraso! Mas então, os tais escritos ficaram, nas férias, esperando a reunião de colegiado, uma vez aceito, subiu para a Secretária G., para assim começar o processo de confecção do papelzinho que atestará a minha maestria (a questão é que em alguns lugares o tal do papel é mais importante que a competência...).
Um dia, estava tranquila em casa e recebi o telefonema da funcionária da Secretaria G. dizendo que havia um problema no meu processo e eu prontamente fui tentar entender e resolver. O prédio da Secretária G. é novíssimo, cheio de vidros espelhados, numa arquitetura antiga. Escolheram bem a cor e as formas e eu estava mesmo querendo entrar para ver como estavam as coisas por dentro... 

A simpática funcionária do setor de pós me explicou tintin por tintin a questão: é que eu passei um semestre a mais que o permitido e teria que, dois anos e meio depois e com todos os requisitos cumpridos, pedir a Câmara de... para aceitar a dilatação do prazo máximo regulamentar do tal do curso... Ufa...  Era algo aparentemente simples... Então vamos lá, saí por uma porta entrei em outra , ou seja, o setor de protocolo , para dar entrada na solicitação e anexar os mil papéis no processo... Senha 82... Ah, tá, está no 53... Sai, atravessei a rua, tirei xerox de outros documentos, subi as escadas e dei entrada no meu diploma de especialização depois de ter esperado mais três pessoas serem atendidas... Voltei pro Protocolo... Ah tá, faltam 15 pessoas... Sentar e esperar... esperar... esperar...

"Tantan" Aparece luminoso o número 82, é a minha vez... Explico o caso para a funcionária, em todos os detalhes...

- Eu não sei resolver isso não, vou passar para Liliana pois ela deve saber resolver, ela trabalhou com esses assuntos de pós-graduação...

Fui para Liliana, contei mais uma vez o que aconteceu e digo que tenho que fazer a solicitação à CÂMARA DE...

-Já estou vendo que tem mais um caso aqui para resolver, esses outros dois semestres têm que ser julgados pela pós-graduação da Faculdade de...

Olho os dois semestres e vejo que está lá, todo certinho, explico que isso já passou pela pós-graduação, que isso já está certo e que eu preciso, conforme disse a funcionária da pós-graduação, da faculdade de... e do setor de pós-graduação desta Secretaria G., ENCAMINHAR PARA A CÂMARA DE... Ela preenche rápido os papéis, do canto do olho eu vejo ela selecionar: FACULDADE DE ... Ai meu Deus!!!

-Pronto, esse é o número do processo e você pode acompanhar pelo site...

-Ahhh obrigada, você colocou para que seja encaminhada para a CÂMARA DE..., não foi????

-(ela respira) Claro que não, tem que ir para a Faculdade de..., ela que vai julgar e então o processo volta para o setor de pós-graduação...

-Senhora, a pós-graduação da Faculdade de... já julgou, enviou aqui para a Secretaria G., e a funcionária da Secretaria G. que cuida dos assuntos de pós-graduação, me disse que eu tenho que enviar para a CÂMARA DE... até a funcionária da pós da Faculdade de... me disse que o processo ia ter que passar pela CÂMARA DE... por conta da matrícula desse referido ano!

-OLHE SÓ, A FUNCIONÁRIA DAQUI DA SECRETARIA G., DO SETOR DE PÓS-GRADUAÇÃO, CUIDA APENAS DO REGISTRO... ELA NÃO SABE DESSES ENCAMINHAMENTOS!! NÃO É MESMO??? 

-Eu não sei...  só sei o que ela me disse...

-COMO NÃO SABE?????????? VOCÊ NÃO FALOU COM ELAAAAA????

Restou-me respirar fundo com aquelas informações, pensei bem: Ela sabe que ela tem o poder pois está com meu processo em mãos e vai mandar para onde ela bem quiser e achar bonito, e é a única que aparentemente resolve as questões de pós-graduação nesse setor.. Olha só, levei dois anos e meio para dar entrada nisso, se o processo vai passear mais por conta da estreiteza mental, nesse determinado assunto, da funcionária em questão, que seja assim então! Eu é que não vou dar atenção a quem quer ter poder, comigo não!! Quer botar o processo para passear? Que coloque...

-Muito obrigada viu Dona Liliane... tchau... (seguido, claro, de um sorriso cínico...)

Fui ao setor de Pós, contei o ocorrido, fui na pós da Faculdade de... e relatei o fato, disseram para que eu não me preocupasse, assim que chegar elas pensarão: quem enviou esse processo para o lugar errado? E encaminharão imediatamente para a Câmara de...  (Na verdade quando chegou teve que esperar para passar mais uma vez pela reunião de colegiado da Pós de..., que acontece uma vez no mês - e a última tinha acontecido quatro dias atrás - até que entenderam que tinham que encaminhar para a Câmara de... pois eles não podiam resolver aquela questão...) É, rapadura é doce mas não é mole não, mestrado é a mesma coisa...

No final percebi que o tal do prédio novíssimooooo, de vidros espelhados, continuava com alguns funcionários que ainda acham que funcionário público tem que dificultar a vida do outro o máximo que puder e ainda quer ter o "poder", ainda que pequeno, por vezes, em suas mãos, para machucar o outro... Vá de retro!!!!... Com alguns funcionários e estruturas poderíamos ter uma universidade pra lá de nova... mas... tsc tsc... Fico apenas pensando se adianta a universidade ser nova, a viola ser bela, e o pensamento e a forma de encaminhar as questões ainda serem bolorentas? Questões filosóficas que acredito que só a Burra Cracia poderá responder...

domingo, 7 de março de 2010

A Cuca vai pegar: Crônicas do funcionalismo público I ou do buraco da sala de aula...

-Alô! Oi, boa tarde Seu Jonas, olha só, eu tenho problemas com a sala em que dou aula, primeiro eu tenho uma disciplina que acontece terça e quinta pela manhã, e vocês me colocaram terça numa sala e quinta em outra...
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Ele logo me interrompe...
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-Professora, todos os professores estão na mesma situação e ninguém reclama!
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Respiro fundo, tento argumentar... 
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-Olha Seu Jonas, sala de aula, para mim, é um espaço onde professor e estudantes vão passar todo um semestre, então a gente cria ali o nosso espaço de compartilhamento, cada um acaba tendo seu lugar mais confortável, lado de sala, é muito mais que um espaço físico, etc...
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-Professora, imagina se eu for fazer isso com todo mundo?
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Pois é, penso eu, imagina se ele vai se dar ao trabalho de perceber que as disciplinas que tem aula em dias diferentes poderiam ficar na mesma sala, pior foi ver que tinha sala sobrando quando a pessoa responsável pela organização das salas fez a distribuição, mas começo a perceber que ele nem sequer sabe o que é uma "sala de aula", e ainda que eu apelasse para Marc Augè e o seu lugar e não-lugar, ia adiantar...
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-Olha Seu Jonas, a sala de terça-feira é complicada, vocês adaptaram uma sala de professores, e enquanto estou em aula escuto toda a conversa da sala da administração, daí tenho que gritar para ser ouvida pelos alunos e vou acabar o semestre sem voz, não tem condições de dar aula assim, pois o tempo todo chegam pessoas para pedir informações, resolver problemas, e infelizmente interfere na dinâmica da minha aula... Eu sei que foi uma emergência, mas não tem condições...
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-Olha professora, a senhora fica reclamando, mas vem um monte de professor aqui me pedir um buraco qualquer para dar aula, e ficam felizes se conseguem...
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Diante do "buraco qualquer" já não escuto mais nada... Minha cabeça gira entre Reuni e a novidade da Universidade Nova... Entre dinheiro em meia, cueca, altos salários e regalias de quem 'habita' as torres gêmeas e as cuias de sentido oposto...  E os professores e estudantes da Universidade estão felizes com um "buraco qualquer" como sala de aula... Cruz credo! Desligo o telefone e começo a perceber que o "buraco" da educação vai ficando é cada vez mais embaixo...

segunda-feira, 1 de março de 2010

Viagens... lugares... - Estação do Peru - Buenos Aires - Argentina


Dia de ir embora, eu tinha uma manhã para rodar tudo e fazer as últimas compras, um lugar não me saía da cabeça: a primeira estação de metrô da América Latina. Eu tinha que ir. Queria muito ver. Fica no início (ou final) da Av Mayo (lugar em que eu estava hospedada), na Praça da Casa Rosada. Desci as escadas e de repente me vi em outro tempo, como se a escada fosse um túnel que nos transportasse para outro tempo, ambiente, sei lá... A minha sensação era de estar nos filmes de faroeste que eu assistia quando criança... Nos trens antigos... Mas aquele era um metrô de 1913, com uma estação que eu acredito que continua em 1913... Enquanto esperava os olhos estavam atentos aos detalhes de madeira, a bilheteria... E o trem chegou, ou melhor,  o metrô, de madeira, com luminárias antigas e janelas abertas... Entrei, me imaginei com um longo vestido de tom claro, pequenos babados delicados, preso com um belo broche, sombrinha na mão, fazenddo uma longa viagem (duas paradas...) e indo ao encontro do mocinho que me esperava no final... E no final, cinco minutos depois de ter entrado no metrô, subi a escada e caí novamente no século XXI, e toda a sua "modernidade"... O amado? É ruim de alguém estar à minha espera... Fui pro hotel pegar as malas... A viagem no tempo foi perfeita para o fim do tour em Buenos Aires...

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Saint-Valentin!

 

Há dois anos atrás descobri que o amor podia ser branco, e que podia ser de um azul intenso que apesar do frio, era quente. Descobri que o amor estava por ali, nos lugares escondidos nos mapas. O amor estava nas ruas, patinado em lagos congelados, prateando telhados, brincando de esconde-esconde, tingindo de vermelho supermercados, despencando em forma de estrelas, fazendo cócegas no nariz, adoçando o paladar em forma gelada ou quente de baunilha francesa, despejando seu encantamento nas estruturas sólidas das cidades... O amor me pegou de surpresa, com neve e desacertos certos. Com pressa me atirou às pessoas, aos lugares, às aventuras... Me fez falar línguas que eu não sabia... Há dois anos atrás, num dia de Saint-Valentin, manhã fria e azul, branca e feliz em todos os flocos, o amor me tomou de assalto... A falta de ar, o coração que se agita, os olhos que não param, as palavras que se atrapalham, a cara de boba... E quem se importa? O amor é construido por pequenas besteiras...

Foto: Detalhe do Musée des Beaux-arts de Montréal, 2008, février, après Saint-Valentin

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Crônica de eu...



Era ela mais uma vez. Sempre essa estranha dentro de mim, eu, a outra, tudo na mesma casca. Ela sempre volta quando menos preciso, quando começo a me reerguer ela vem, imperiosa, reclamar seu lugar. E como ela é forte...
Chegou e eu nem percebi, quando me dei conta já estava instalada. Atirou meus planos pela janela, e me atirou mais uma vez no vazio, a pensar que eu nada sou. Por que ela sente prazer com isso? E o que é mais intrigante neste sadismo, é que ela, ela sou eu...

domingo, 27 de dezembro de 2009

Viagens... lugares... - Igreja São Francisco de Assis da Pampulha - Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil



Escrito em azul, os desenhos vão poeticamente contando as histórias... Lembrei do texto que eu apresentaria dias depois no congresso de arte, denominado "Por entre imagens azuis..." , Saborosa coincidência!... Comecei a passear por entre os azuis da Igreja São Francisco de Assis da Pampulha, dando voltas em suas voltas,  desvendando Portinari e Niemeyer... Traço, plano, cor, luz, azuis!!... Sorria para a foto... Ops, a noiva vem passando com seu noivo, vão rodeando a lagoa entre flashes... Ihhh ônibus de turistas... Dentro da igreja não pode fotografar, mas através do vidro, ahhh...  a gente sempre consegue um jeito de subverter a ordem em nome da pintura poética...

sábado, 19 de dezembro de 2009

Viagens... lugares... - Primeiras Impressões de Belo Horizonte e o Mercado Central - Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil



Cheguei muito cansada, acordei as quatro e meia da manhã para pegar o voo das dez para as seis de Salvador para Belo Horizonte. Depois de voar, fui ver a forma mais barata de chegar ao aeroporto: um onibus sem ar-condicionado mas bastante confortável que custa a metade do preço do outro e um décimo do preço do taxi de lá dos Confins até o centro da cidade. Uma vez no ponto final, rodoviária, peguei um taxi até o hotel (tudo ficou pelo preço do ônibus com ar-condicionado, e eu ainda parei na porta do hotel, sem necessidade de descer o ladeirão), aliás, é preciso dizer que Belô é uma cidade de muitas ladeiras, aliado a elas muito sol e um clima seco (que bela mistura, hein!?)... Cheguei no hotel as 11hs e tive que esperar até as 12hs em ponto para entrar no quarto (coisas do Formule 1). Dormi até 13hs30: a fome falou mais alto. A comodidade me fez atravessar a rua e almoçar no restaurante em frente,  a comida é boa! Acabei de comer e... tchan tchan... a previsão do taxista naquela manhã banhada de sol estava certa: a chuva começou a desabar forte pelas ruas da cidade e eu, ilhada no restaurante... Uns 40 minutos depois, hora de fechar, mas o garçon me garantiu que eu podia ficar a vontade, eu estava inquieta, minha única tarde livre ia literalmente por água abaixo! Mas não é que o garçon conseguiu um guarda-chuva e atravessou a rua comigo até me deixar na livraria em frente!? Tenho que registrar que a maioria dos mineiros são bastante simpáticos e gentis. Mais uma hora esperando a tal da chuva, e nisso a tarde já ia embora sem nenhuma piedade da turista qua andava pela primeira vez por aquela cidade... Comprei um livro em inglês e outro em francês depois de garimpar os mais baratos, eu quase decorei todos os livro das prateleiras...
Cansei de esperar, a minha inquietação foi maior que o preço que paguei no cabelo para ficar um pouco mais ajeitadinho para a apresentação do  meu trabalho no congresso de arte, saí na chuva, agora rala, por entre as raras marquises, correndo nas ruas, com um casaco na cabeça sendo olhada , por vezes, tal qual olham doidos de rua. Pouco me importava, eu queria chegar ao Mercado Central! Duas quadras e encontrei uma lojinha vendendo sombrinhas, que alegria: comprei imediatamente! E assim uma quadra protegida da chuva dei de cara com o mercado, entrei atônita... Quantos cheiros, quantas cores, quanta variedade! Aquilo era uma festa para os sentidos!
Passei e saborei cada cor, cada cheiro (tirando claro, a parte que vende aves... pratiquei a ausência do cheiro), cada objeto, cada pequeno detalhe... Nunca vi um mercado tão completo: grãos, aves, laticinios, salão de beleza, produtos árabes, japoneses, lembranças, panelas, fitas e tecidos, biscoitos., banco.. enfim, tudo o que o que se pode precisar, encontra-se lá! Um andar e meio e saídas para várias ruas... As ruas da cidade, tenho que deixar meu protesto, foram projetadas para a gente se perder entre diagonais que cruzam as horizontais e verticais perpendiculares. Nossa, dei voltas e voltas com mapa na mão, entro, saio e me perco. E me perder foi adorável lá no mercado, comprei bolotas de chocolate rechedas com cereja e damasco e me diverti por entre as lojas, de um lado a outro, centro, sobe, desce, desentristesse... Fui embora satisfeita com o passeio... A chuva? Passou!... Quase volto para pegar o dinheiro da sombrinha de volta, mas vai que volta a chover? Depois de comprar meu jantar no "Super nosso" (eu adorei o nome!) voltei para o hotel analisando o dia...
Mas eu só descobriria mais tarde, depois de odiar a cidade nos dois primeiros dias, que Belo Horizonte é uma cidade que a gente vai amando aos poucos... Voltei com saudades das linhas e curvas de Niemeyer, da cachaça no bar da esquina, da poesia e prosa no ônibus, da feira do Palácio das Artes, dos museus, do Palácio das Artes, de andar pelas ruas de Savassi, e de muitas outras coisas escondidas entre os emaranhados das ruas planejadas da cidade...


Obs.: Acontece que por vezes fico tão encantada com os lugares ou mesmo pessoas que não registro em minha máquina fotográfica, é como se eles ou elas só pudessem permanecer na minha mente, pedaço de saudade que não se vê... não tenho foto do mercado...